DA BANALIDADE DA VIDA OU DE “FAZEDORES DE ANJOS” shellAHAvellar

Tenho pensado muito nos últimos tempos, eu diria “quase todo dia”..sobre estes públicos de risco e em situação de exclusão.

Mas apesar de ser sensível e solidária a todo este leque de pessoas sob ataques e perseguições estúpidas, a questão da mulher e seu lugar no mundo,volta sempre a incomodar.

Até porque também faço parte deste target.

Ontem, no final da tarde, na fila do supermercado, uma senhora entrou meio apavorada dizendo que o vigia de uma casa em obras no Brooklin, encontrou morta ,uma menina de aparentemente 10 anos, com sinais de violência e estupro.

As reações ?Normais, de espanto,e indignação.E não faltou quem dissesse que as meninas “de hoje” aos 10 anos já parecem mulheres , e se vestem de maneira extremamente sensual.

Daí, me veio à cabeça ,a mulher saudita que foi estuprada e “de quebra “,por isto,recebeu 200 chibatadas e prisão por 6 meses.

E , pensei na menina.Que nome teria? Teria pais vivos e presentes? O que estaria fazendo porali?

Resolvi batizá-la de “Angel”.E tentei desenhá-la no auge de seus dez anos: -Será que ia à escola?Fazia todas as refeições do dia?Se tinha sonhos?Se gostava de estudar ? O que será que ela gostaria de ser ,ou vir a ser ou de ter sido? De amar e de ser amada?

E esta coisa me pega e me remexe e me embrulha , num misto de cansaço e solidão.

A gente que escreve, pode esboçar os afrescos do imaginário e dar à menina o retrato que merece: -”simplesmente menina.”

Penso nas meninas de 10 anos que conheço.Na menina que fui.Na menina que minha filha foi.

Nas meninas –mulheres de todos os matizes que vivem por aí afora.Nas molecagens.No abandono das bonecas e em suas recaídas .Nos bichinhos de pelúcia que vão ficar sem seu abraço companheiro de noites insones ou medrosas.

Dos olhares românticos para aquele menino ou menina especial. Dos diários cor- de- rosa. Dos papéis com marcas do batom das mães. Das intermináveis tagarelices ao celular com as melhores amigas .Dos vestidos floridos e esvoaçantes .Da ansiedade das festas. Das tristezas sem motivo. Da euforia gostosa de simplesmente existir e ter a vida pela frente.

A vida que se banaliza pelo instinto selvagem.Pelo animal que grita e se sobrepõe ao racional impotente.

A vida, que num átimo ,em que a ternura dá lugar às línguas sedentas ,mãos violentas, órgãos invasores,de homens que ignoram a nobreza em si próprios.

Será que tentou resistir ao flagelo?Ou aquela memória não esperava a derrota pra se revelar?

Teria uma fé clandestina que a mantivesse viva? Pra testemunhar seus horrores?

Será que tentou gritar?Será que algum transeunte a ouviu ,mas não tinha “tempo” de parar para averiguar se alguém de sua “raça humana” precisava de ajuda?

Mas ,após o fato “consumado”, muitos destes transeuntes apressados, tem tempo de parar,” para saber o que houve, para ter o que contar quando voltar pra sua casa .

E, alguns destes ficam ali por horas, se alimentando da dor alheia. Para compensar a opacidade de seus dias .E contam um conto mais um ponto. Porque quanto mais sensacional suas invencionices, mais ouvintes gulosos serão saciados. Até a nova tragédia urbana.

Saio correndo do supermercado, apresso o passo, cada vez mais fortemente.

Preciso ir pra casa.Chorar baixinho por Angel, esta desconhecida tão familiar.

A melancolia me leva até o universo das luas , que se compadecem dos artistas e faz brotar de suas feridas, imagens oníricas que o desprendem de sua realidade fúnebre.

E me inebrio com o farfalhar de asas de Angel , que alça vôos mágicos para bem longe das ninharias e dos monstros antropóides que ,com seu bestiário, insistem em molestar as crianças e “fabricar anjos”.

Aceno para Angel,que deixa atrás de si rastros de estrelas e poeira de fim de mundo.

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/08/justica-autoriza-aborto-em-menina-de-10-anos-gravida-apos-estupro-no-espirito-santo.shtml

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/08/exame-de-dna-confirma-que-tio-estuprou-e-engravidou-crianca-de-dez-anos-no-espirito-santo-diz-tv.shtml

O DIA EM QUE A LITERATURA DEIXOU DE EXISTIR

shellAHAvellar

E Fez-se o Caos.

Estabeleceu-se a treva.

De repente, tudo era escuridão. As cores foram se desbotando até se perderem no zoom-in de um tempo sem nenhum lugar. O tênue limite entre Céu e Terra se esvaiu numa fumaça bolorenta. O chão se fez lodoso, e a aridez tomou conta de tudo.

Já não havia formas, somente projeções de sombras da sombra propriamente dita.

Não havia som.

A explosão do início, repetiu um Big- Bang às avessas, implodiu o Planeta, as galáxias e as estrelas e o universo inteiro até se afundar num buraco negro.

Não havia mais identidade

Perderam-se as referências. Era apenas um deserto de almas penadas.

As letras despencavam aflitas. As vírgulas se contorciam sem direção.

As exclamações se amuaram. As interrogações desistiram das respostas.

As figuras de sintaxe se esfacelavam invertendo as elipses, zeugmas e hipérbatos.

As metáforas confundiam os sentidos figurados e a verdade.

Sujeitos foram envenenados e verbos ficaram sem objetos diretos.

As fitas do DNA das palavras se dissolviam numa sopa de ignorância absoluta.

Artistas, professores, escritores e intelectuais num átimo de desespero tentavam ressuscitar a criatividade.

Heróis, mitos, bandidos e malfeitores trocaram de personalidade e se fundiram numa coisa só, desconstruindo ilusões de um final feliz.

Aventuras e ficções se tornaram uma realidade apocalíptica.

As histórias se metamorfoseavam em estórias retratando apenas anti-memórias e as fábulas faziam triunfar o diabo e suas armadilhas.

O átomo se desintegrou, engolindo as partículas, contrariando Newton, relativizando Einstein, e deixando a ciência, nos limites do perplexo.

Finalmente o mundo era uno, sem diversidades.

Lá se foram as tradições e as castas. A oposição deixou de ter sentido. A subtração odorífica, deu lugar à insipidez. E a solidão se fez presente, inundando os restos de nossa possível esperança.

Signos, sinais, sentimentos e pensamentos queimavam num inferno sem chamas e sem calor.

Flutuando no vazio de mim, me permiti experimentar a desistência. Simplesmente me morri, quando O FASCE sentenciou:

– “A partir de agora, a Literatura deixa de existir.”

A palavra “fascismo” vem do italiano fascio, que significa “feixe”. Na Roma Antiga, O FASCE (versão em latim da palavra), era um machado revestido por varas de madeira. Ele geralmente era carregado pelos lictores, guarda-costas dos magistrados que detinham o poder. O FASCE era um símbolo de autoridade e união: um único bastão é facilmente quebrável, enquanto um feixe é difícil de arrebentar.

https://super.abril.com.br/historia/voce-sabe-o-que-e-fascismo-entenda-o-termo

https://exame.com/economia/proposta-de-guedes-para-taxar-livros-e-golpe-fatal-para-editoras/

UM BOM ABRAÇO SE DÁ DE PÉ ShellahAvellar

Conheci pessoalmente Audálio Dantas 17 de agosto de 2013, na FNAC Pinheiros, no Lançamento do projeto Entrevista Aberta de Guilherme Azevedo, do Portal Jornalirismo. Tive a oportunidade de lhe fazer tantas e tantas perguntas sobre seu livro As Duas Guerras de Vlado Herzog e também sobre sua trajetória no Jornalismo e na luta pelos Direitos Humanos.

Menina ainda, nos anos 60, no Rio de Janeiro, já tinha lido, na Revista Cruzeiro sobre sua “descoberta” Carolina de Jesus e seu Quarto de Despejo.

E nos Anos 70, na Revista Realidade sua matéria Povo Caranguejo sobre os Catadores de Caranguejo do Mangue da Aldeia Livramento na Paraíba.

Nem eu mesma tinha noção da importância daquele momento histórico, até começar a entrevista. Debatemos sobre Jornalismo Literário, minha paixão, até que finalizei a entrevista com uma última pergunta.

-E se Vlado Herzog, estivesse aqui agora, qual a pergunta que você gostaria de ter feito,   e deixou de fazer a ele?

Audálio parou, e seu silêncio grave, durou um minuto. Respirou e disse: -Você faz muitas perguntas difíceis…(todos rimos)

E ele respondeu: Vlado,por que você disse à Repressão que não era comunista, no seu interrogatório?

E eu disse: -Você já respondeu a esta pergunta, quando deu ao seu livro o título de AS DUAS GUERRAS DE VLADO HERZOG.

Ele disse:-Como assim?

Respondi:-Talvez porque já tivesse fugido de uma guerra, e agora enfrentando mais uma, na própria pele dilacerada, e de sua impotência frente a uma realidade brutal, tenha sentido medo. E o desespero pode provocar reações imprevisíveis.

Ali encerrou-se a entrevista e começou uma profunda amizade de respeito mútuo.

http://www.jornalirismo.com.br/videos/documentario-entrevista-aberta-com-audalio-dantas/

https://www.youtube.com/watch?v=ipX3pt-eQyk

Voltei a entrevistar Audálio Dantas, numa matéria sobre o Desaniversário do Golpe Militar em março de 2014.

http://www.jornalirismo.com.br/jornalismo/desaniversario-do-golpe-ser-de-esquerda-ontem-e-hoje/

Daí, já nos frequentávamos. Conheci sua família linda, Sua esposa, a guerreira Vanira Kunc. Sua doce e talentosa filhotinha Mariana  e a portentosa Juliana que lhe seguiu os passos. Bem como os filhos de outro casamento e de seus leais amigos .Estive presente em vários lançamentos e comemorações familiares e de honra a seu reconhecido mérito.

Mas, nada se compara à sua indicação ao prêmio Averroes 2017.

Em duas etapas. O dia da comemoração da indicação e o dia da entrega propriamente dita.

A mais perfeita tradução destes eventos é a seguinte: Um festival de Afetos.

Lá estavam pessoas que realmente lhe amavam e reverenciavam.

E, mesmo os que não se conheciam, sorriam uns para os outros, confraternizavam e se abraçavam por respeito a você.

Pensei comigo, estar aqui, no meio de tantas cabeças brilhantes, olhares límpidos e sorrisos largos era por si só uma revolução: A potência da Palavra em Ação.

E, então, ao final, me aproximei para dar um abraço e um “até breve”.

O guerreiro estava descansando da festa de entrega do prêmio Averroes.

Eu disse: – Pode ficar aí sentadinho!”

Daí ele se levantou e falou:-Um bom abraço se dá de pé!”

E, foi nosso último abraço terreno.

Entretanto o abraço cósmico se eternizou naquele momento, porque não sabíamos que seria o último.

Nos reencontramos no auditório do Sindicato dos Jornalistas, sua casa maior, em maio de 2018.

E, junto a sua família e aos seus  amigos fiéis, numa tarde triste, de mãos dadas numa ciranda ao seu redor, sob a foto de Vlado Herzog, e sob um céu que não era o de Luiz Gonzaga, se deu a despedida oficial, meio ao burburinho dos profissionais de Comunicação e do Jornalismo que você tanto amou e que lhe trouxe tantas alegrias e desapontamentos.

E, hoje, quando você completaria 91 anos, aqui vai o meu abraço.

Em plena quarentena, face a uma pandemia sem precedentes na história da humanidade, sob a chibata de um fascismo mascarado de Democracia. Aquela mesma, nossa velha conhecida, sempre ameaçada de morte ao longo das civilizações.

Permanecemos todos de pé, ainda que com o coração partido e os pés sangrando.

E, sim, querido camarada Audálio.

O nosso grito é o seu grito.

E, embora o povo se arraste ,neste momento infernal, por uma uma onda de estultícia e embrutecimento , a Liberdade criadora modela a natureza e a delicadeza exalta o sublime .

Feliz Aniversário!

ps: agora você já deve ter tido a resposta do  Vlado, à sua questão, ao vivo e em cores do outro lado da vida.

http://www.sjsp.org.br/noticias/audalio-dantas-e-homenageado-com-o-premio-averroes-2017-00ea

TORTURA NUNCA MAIS Shellah Avellar

Diverse_torture_instruments.jpg (448×570)




Imposição de dor física ou psicológica por crueldade, intimidação, punição, para obtenção de uma confissão, informação ou simplesmente por prazer da pessoa que tortura

A TORTURA

CAI DENTRO DA MEMÓRIA

PARA MATAR

A LEMBRANÇA

DA LEMBRANÇA.

A TORTURA

AFOGA A JUSTIÇA

PARA MANOBRÁ-LA

À SUA VONTADE.

A TORTURA

DISTORCE A VERDADE

PARA  EXTIRPAR

A CAPACIDADE DE TER

VONTADE.

POR ISSO,

HOJE EU DECRETO:

AQUI JAZ A TORTURA!

AQUI JAZ A MESTRA

EM DESASTRES!

AQUI JAZ

O SILÊNCIO IMPOSTO!!

AQUI JAZ A VIOLÊNCIA!

AQUI JAZ A PELE DILACERADA.

AQUI JAZ O PEITO ENSANGUENTADO DE MENTIRAS.

POR ISSO, HOJE,

DESFEITA A SOCOS,

SEM TRINADOS OU RIMAS,

SEM MEDO DE NÃO SER NADA,

CÉLEBRE OU ANÔNIMA

PROCLAMO MEUS AIS:

TORTURA NUNCA MAIS!

http://www.jornalirismo.com.br/jornalismo/libertas-quae-sera-tamen/

O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.

Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003

torturaszapateando.gif (477×304)
TORTURA NUNCA MAIS

TRANSversando Shellah Avellar

CADERNO ABERTO

NA PÁGINA

TRANS.

TRANSGRIDO.

SOU MEU PRÓPRIO ANJO.

CAÍDO.

CELULAR EM VIVA-VOZ

QUE DÁ SEMPRE

SINAL DE OCUPADO.

TRANSITIVA.

BINÁRIA.

MÚLTIPLA.

SUBVERTO.

SUJEITO

INEXISTENTE,

RODOPIO.

SILENCIO.

GRITO!

MARIPOSA

DE NOITES LOUCAS.

TRANSCENDO.

DE UM DIA

QUE EU NÃO SABIA

QUEM EU ERA.

ME JOGO

EM NUVENS

DE SUSTO.

QUE, LOGO,

ME MADRUGAM.

ECOS CEGOS.

MISTÉRIOS.

POESIA

FRIA.

HIERÓGLIFO.

DESVENDO A MULHER

PLENA.

METAMORFOSE DE SIGNOS.

BORBOLETA -DESVARIO

QUE VOA

TRANSCREVENDO

A PRÓPRIA

HISTÓRIA.

REFUGIADOS Shellah Avellar

REFÚGIO

                A CÉU ABERTO

REFUGIADO

                      EM VIAS

                      ENVIESADAS

                              ESCALA DE SI

                   SEM                         SOL

                                PONTO DE FUGA                         

                   SEM                                     ORIGEM.

                                          O                HORIZONTE

                                                                    É ONTEM.

REPÚDIO

              AO LÉU.INCERTO.

REPUDIADO

                      EM ALEGRIAS.

                    SEM VOZ.

                    SEM CORTESIAS.

 PÁSSARO SEM

     TRINADO.

             OVO

                     SEM CHOCAR.

                     GEMA      FORA

                           DE LUGAR.

CARÍCIAS        

                            DE          

                              ESCORPIÃO.

                            DESCANSA

                NO                   CHÃO.

    BANHADO EM ÁGUAS FÉTIDAS.

                                                        SONHOS

                                                        SACOLEJANTES.

    BARCOS  

  FURADOS.

            MALAS  VAZIAS.

                      SEM PAIS.

                      SEM PAÍS.

                                         LUTO DA PRÓPRIA

                                                          HISTÓRIA.

                                          NUDEZ   

                                                     DE        ESPERANÇA .

                                 GLÓRIAS                                            ABORTADAS.

                      TEMPOS                 DE  

                                                       DESPREZO.

                                                      

1450152434446.jpg (620×349)

https://www.cnne.net.br/poesia-inedita-2019

http://www.jornalirismo.com.br/jornalismo/refugiados-migrantes-e-deslocados/

IN VINO VERITAS Shellah Avellar

Acrílico sobre Tela(70×140)SP 2018

COMO SE FOSSE A MADONA

COM SEU MENINO

A VIDEIRA E SUAS FOLHAS

SE ESTENDEM PARA O CÉU ,

CANSADAS DA REALIDADE.

PARA CONQUISTAR O AMOR,

ESTE IMPÉRIO EXTINTO.

OU RESGATAR UMA VIDA

QUE PARECE FORA DE SI…

intervenção vocal:ayiosha Avellar

música incidental:Comunhão (autoria:Fernando Brandt & Milton Nascimento)

MULHER Shellah Avellar

acrílico sobre tela (70×140)

MULHER-LUA

MULHER-SOL

MULHER QUE SANGRA

MULHER QUE AMANHECE

MULHER QUE CHORA

MULHER QUE ANOITECE

UM ESTRANHO JEITO

DE SER PERA E POEMA

E SEMENTE DE VIDAS

SUJEITA A ABUSOS

POR SER VIOLÃO

OU POR SER

MULHER SOMENTE

OBRA-PRIMA

EM CONSTANTE CONSTRUÇÃO ..

atriz: Ayiosha Avellar

MISCIGENAÇÃO Shellah Avellar

(Acrílico sobre tela 4Ox40)São 4 telas(20×20) k podem ser remanejadas, mostrando as várias possibilidades de diálogo entre as quatro raças humanas.(ainda ñ finalizada)

Como se fosse uma guerra

O BRANCO,O NEGRO,

O AMARELO E O VERMELHO

Se digladiam..

Entretanto Estas mil faces

Têm ímpetos de céu

E olhos cheios de estrelas..

VOCÊ SOU EU

EU SOU VOCÊ

Talvez não faça sentido.

Quantos pulos são precisos

Para juntos darmos um salto?

E podermos ser Tudo o que quisermos?

Abrindo a página

Em branco e preto

Para que todas as cores

Pinguem e se misturem?

E os pontos de vista

E acordes dissonantes

Se harmonizem

Em um único e vigoroso SOM?