O GRITO DO SILÊNCIO – REPARAÇÃO PSÍQUICA PARA VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DE ESTADO Shellah Avellar

DIREITOS HUMANOS /COMUNICAÇÃO ORAL

No processo de Comunicação corporal, as células trocam energia e informação com o resto do organismo. Recebe nutrientes e expele algumas substâncias. E o corpo interage com o meio-ambiente. A comunicação integra dois sistemas básicos: o circulatório e o nervoso. Nada pode ficar parado ou retido, para manter a homeostase.

O linguista russo Roman Jakobson,apresenta  seis elementos constitutivos de comunicação:1) O emissor ,determina a função expressiva 2) O destinatário,a função conativa 3)A mensagem, função poética que engloba todas as figuras da retórica 4)O contexto, determina a função referencial.5) O contato,a função fática, que tende verificar se a escuta do destinatário efetivamente se estabeleceu. 6) O código, a função metalinguística, que incide sobrea linguagem tomada como objeto (por meio dele, emissor ou destinatário verificam se utilizam o mesmo léxico).

O linguista chega a estabelecer semelhanças estruturais entre estes dois sistemas de informação entre o código genético e o código linguístico entre as mensagens químicas, que, na arquitetura da célula, transmite as ordens da vida.

Tudo isto para justificar que, quando o silenciamento é imposto pela Violência de Estado, causa um colapso no corpo emocional, que a princípio é imperceptível, mas em algum momento a estrutura física e psíquica vai gritar por socorro.

Depois de 45 anos de silenciamento, por conta da ditadura militar de 1964 ,pude reabrir feridas da memória e compartilhar o trauma encravado em meu corpo. E falar abertamente. Pela primeira vez tive um sentido de pertencimento, ao integrar as Clinicas de Testemunho.

Gostaria de ver cada vez mais pessoas sendo beneficiadas por esta ferramenta de reparo psíquico, para que possam assumir seu protagonismo e se tornar sujeitos da ação, sem se sentir num eterno velório emocional”. Creio que o Ministério da Saúde em parceria com o Ministério de Direitos Humanos, possam inovar e promover um Centro de Referência de Reparação Psíquica, dentro do contexto de atendimentos do SUS -Sistema Único de Sáude, institucionalizando definitivamente esta prestação de serviços para as vítimas de violência do estado.”

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PALAVRAS -CHAVE

 HOMEOSTASE. SINTAGMA.REPARAÇÃO

Instituto Silvia Lane – IV Simpósio – 2023 (compromissosocial.org.br)

RESULTADO DA AVALIAÇÃO

O trabalho O GRITO DO SILÊNCIO. (REPARAÇÃO PSÍQUICA PARA VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DE ESTADO.), de autoria de Shellah Avellar foi APROVADO na modalidade Comunicação Oral, para apresentação no evento IV Simpósio Nacional – Psicologia e Compromisso Social – 2023 que foi realizado de 01 a 03 de junho de 2023.

As apresentações de trabalhos foram realizadas na parte da tarde em Grupos de Trabalho. Os Grupos de Trabalho foram formados a partir dos trabalhos inscritos, agrupando temas que possam favorecer o debate. Os grupos permaneceram fixos durante os três dias de evento, de forma a acumular e aprofundar as discussões.

Cordialmente,  Comissão de avaliação dos trabalhos

*Foram submetidos 989 trabalhos e somente 250 trabalhos foram aprovados para apresentação no IV SIMPÓSIO NACIONAL DE COMPROMISSO SOCIAL, do Instituto Silvia Lane.

RESUMO

No processo de Comunicação corporal, as células trocam energia e informação com o resto do organismo. A comunicação integra dois sistemas básicos: o circulatório e o nervoso. Há um elo de subordinação entre ambos. Nada pode ficar parado ou retido, para manter a homeostase.

O linguista russo Roman Jacobson ,chega a estabelecer semelhanças estruturais entre estes dois sistemas de informação entre o código genético e o código linguístico entre as mensagens químicas, que, na arquitetura da célula, transmite as ordens da vida e a mensagem linguística.

Tudo isto para justificar que, quando o silenciamento é imposto pela Violência de Estado, causa um colapso no corpo emocional, que a princípio é imperceptível, mas em algum momento a estrutura física e psíquica vai gritar por socorro.

Depois de 45 anos de silenciamento, por conta da ditadura militar de 1964,pude reabrir feridas da memória e compartilhar o trauma encravado em meu corpo. E falar abertamente. Pela primeira vez tive um sentido de pertencimento, ao integrar as Clinicas de Testemunho.

Gostaria de ver cada vez mais pessoas sendo beneficiadas por esta ferramenta de reparo psíquico, para que possam assumir seu protagonismo e se tornar sujeitos da ação, sem se sentir num eterno velório emocional”. Creio que o Ministério da Saúde em parceria com o Ministério de Direitos Humanos, possam inovar e promover um Centro de Referência de Reparação Psíquica, dentro do contexto de atendimentos do SUS -Sistema Único de Sáude, institucionalizando definitivamente esta prestação de serviços para as vítimas de violência do estado.”

A DIALÉTICA DAS APARÊNCIAS Shellah Avellar

-BAM! 

Mirabella bateu a porta do bagageiro de seu golzinho mil de cor branca.

Quando se dirigiu para abrir a porta da frente, cinco homens se aproximaram.

Dos quatro, dois de corte de cabelo careca. Os outros dois, cabelos caindo aos ombros, em desleixo e relaxo. Os quatro, de buço e quase barba. O quinto, mais velho, baixinho e atarracado, só empesteava. Sacou um revólver e relinchou como uma mula num sobressalto.

-É um assalto! Me dê as chaves do carro e se afaste !

Ainda estupefata, Mirabella, com seus órgãos se movendo dentro do corpo, grudou nas chaves e suplicou: -Moço, por favor, preciso do carro para trabalhar. Deixe ao menos eu pegar a bolsa e meus livros e CDs que são meus instrumentos de trabalho.

Ele se aproximou, apontando a arma para sua testa e com uma voz de dentes de morder, vociferou, do fundo de suas sombras individuais, morrendo de medo, mais que ela: – Quer morrer, moça?

Os outros quatro a rodearam. Seus olhos punham palavras de medo.

Mirabella ensaiou gritar, em sua petulância ingênua. O rústico, com hálito de aguardente, estendeu a palma, recurvado, de olhos nas chaves que eram ferro em brasa nas mãos de Mirabella, que, sem escapatória, finalmente, as entregou, vacilante.

Os cinco entraram no carro e partiram, sumindo na noite, sabe-se lá para onde…

Mirabella, se sentiu sozinha como uma página em branco.

Prisioneira de um livro que ainda estava por nascer.

Olhou em volta. Para ver se alguém tinha visto ou ouvido o acontecido.

Latido de cães. Noite sem luar. Precisava voltar à realidade. Respirou profundamente.

Foi subindo a ladeira. Tentou se localizar. Olhou a placa. Rua dos Jornalistas. Sorriu. E nenhum deles por aqui para dar o furo do flagrante delito.

Viu uma portinha aberta com luz depois de passar por um muro alto. Lá estava um senhorzinho. Na parede, um relógio marcava 23h.Vislumbrou a mesa com um telefone. Perguntou se podia usar.  O velhinho, já de barba branca imposta, assentiu. Ela disse: – Fui assaltada. Levaram tudo. Preciso ligar para alguém.

Ele disse – Eu vi. Fiquei com medo de chamar a polícia e os rapazes fazerem mal pra moça. A moça tem que ligar pro 190.

Assim ela fez. Contou o acontecido. Mandaram ela fazer o BO (Boletim de Ocorrência) na delegacia mais próxima. A XX da Zona Sul. Assim fez. Saiu de lá por volta das 02 horas da manhã. Ligou para casa. E também para Ernestino, diretor-presidente da Empresa para qual trabalhava, onde exercia a função de Diretora de Projetos Especiais, para avisar que não iria trabalhar pela manhã, porque ia resolver coisa de segunda via de documentos e cartões dos bancos. Esse a instruiu também a ligar para o Detran avisando e dando os dados do carro. 

-Quem sabe, eles podem ter usado o carro para um assalto e depois abandonam em algum lugar, – ele disse.

Enfim. Noite agitada e tensa. Com os pés na aurora do dia. Sem sossego e ansiosa por repouso. Foi para casa.

Mirabella era moça guerreira. Se virava nos seus 39 anos. Tinha uma bebê de 8 meses, cuja criação assumira sozinha, e que a esperava dormindo a sono solto, tendo por companhia, uma babá assustada, por conta de seu atraso.

Tomou um banho demorado. Liberou a babá e assumiu seu lugar na cama, onde tentou relaxar, abraçada à sua bebê, sem pregar os olhos.

O filme do assalto rebobinava incessantemente em sua mente agitada.

No dia seguinte, tomando as devidas providências, retomou a sua rotina enlouquecida. Agora, sem carro, e sem possibilidade de comprar outro tão cedo,  pois não tinha seguro. Na verdade, sempre teve. Mas, não renovou por conta do orçamento apertado e das despesas nossas de cada dia.

Todos diziam que ela não iria rever o carro. 

– Os  Golzinhos da Volkswagen são muito visados para desmanche. E sabe-se lá por que, ela dizia que o carro iria reaparecer.

E, assim, vida seguiu.

Nove meses depois. O interfone do apartamento no Real Parque, tocou por volta de quase meia-noite. O porteiro falou que tinha uma pessoa que se dizia ser primo de Mirabella, e, insistia em falar com ela. Atendeu. O tal sujeito disse que uma parente dela estava agonizante em Suzano e que esperava que ela descesse e fosse com ele até lá.

Mirabella achou muito estranho porque não tinha nenhum parente em Suzano. Perguntou o nome e ele não respondeu. Pediu para passar o interfone para o porteiro.

Ela solicitou ao porteiro que descrevesse o cara. Ele disse que eram dois. E que estavam de carro. E era um fusca verde. Anotou a placa. E, por fim, o mandou embora.

Disse que o cara se enfureceu e gritou  que se a parente morresse a culpada ia ser ela.

Mirabella ligou para 190, contou o caso e confirmou que a chapa era fria.

Achou aquilo tudo insólito. Embora tivesse as bem-aventuranças dos bocejos, não conseguiu dormir.

No dia seguinte, no fim da tarde, recebeu um interfone de uma pessoa que se apresentou como policial da YY Delegacia de Distrito AA da Zona Leste . Disse que tinham localizado um carro. Um Gol, que tinha sido roubado. Descreveu o veículo e Mirabella confirmou que era o seu.

Disseram que ela deveria acompanhá-los para reconhecer o carro.

Ela disse que só poderia ir no dia seguinte. Eles insistiram. Ela negou. Perguntou se o carro não deveria estar na delegacia onde ela fez o BO. Eles disseram que não. Ela pediu o cartão do policial e disse que iria lá no dia seguinte. Alegou não ter com quem deixar a bebezinha.

E, subiu. Com a pulga atrás da orelha. Tudo parecia esquisito. Apesar de Mirabella estar super feliz de terem encontrado o carro.

Ligou para a Delegacia do Jabaquara. Eles não haviam sido informados de que o carro tinha sido encontrado.

Ligou para Ernestino, que por acaso era advogado, embora não exercesse a profissão. Perguntou se ele poderia acompanhá-la no dia seguinte. Porque, além de estar sem carro, não queria ir até lá sozinha.

Contou da visita inesperada da noite anterior e do papo esquisito de o tal parente estar agonizando. Da placa fria, etecetera e tal.

Ernestino  apareceu no horário marcado, trazendo um amigo de infância que era advogado criminalista. Ficou sabendo da história e se prontificou a ir junto.

Lá chegando, por volta das 15 horas, o exagero estava estabelecido. O sinistro sussurrava errático.

O que poderia ser um dia de júbilo se tornou um imperfeito aloprado.

Juntamente com o Delegado e o escrivão que tinha se apresentado como policial ao visitar Mirabella no dia anterior e ter pedido que o acompanhasse, estava presente um homem alto e forte que disse se chamar Rubão.

O delegado perguntou ao tal do Rubão, que fazia juz ao aumentativo, se Mirabella era a pessoa que lhe havia vendido o  GOL.

Rubão confirmou. E disse que ela tinha ido à sua oficina de carros usados, com seu marido e vendido o carro para ele.

Para espanto de Mirabella e dos seus dois amigos.

Esta moça, embora doce de afeto, era tinhosa. E teve entremeios de risadas nervosas. Sua espontaneidade deu lugar à indignação inconteste, cuja verborragia naquele momento traduzia as tempestades de sua surpresa.

Mirabella era divorciada há vinte anos e não tinha marido.

E o pai de sua filha tinha ido  embora para a Alemanha ,dois meses depois da bebê ter nascido..

O advogado pediu para que Mirabela se acalmasse e ouvisse o tal do Rubão.

Mirabella, ofegante, assentiu, a contragosto.

Abriu-se inquérito.

Mirabella, de agredida, passou a ser considerada suspeita, de ter vendido seu próprio carro e ter simulado o assalto.

Como era moça distraída, deixava sempre   os documentos do carro no porta-luvas. Embora sempre alertada pelos amigos.

E lá tinha todos os seus dados. Sua bolsa tinha seus documentos e cartões.

Foi fácil localizá-la.

O Rubão, mostrou um recibo da venda assinada por ela. 

Tinha seu nome inteiro, mas a  assinatura não batia de jeito nenhum. Fizeram a assinatura por extenso,  e faltando um ele em Mirabella. 

E, se tinha uma coisa que Mirabella fazia questão era dos tais dois eles. Era seu diferencial nos cartões de visita. 

E sua assinatura era bem original e complexa, porque ela era muito sofisticada com estes detalhes.

Ainda assim, a suspeita era ela.

Mirabella teve que tirar fotos de frente e de lado.

E um interrogatório sem fim. Tudo sendo anotado pelo tal escrivão de nome Toninho.

Sua letra iria ter que passar por um grafotécnico especializado.

O delegado, incisivo:

-Descreva o assalto!

-O que a senhorita estava fazendo sozinha, por volta as 23 horas na Rua dos Jornalistas no Jabaquara?

-Fui convidada para dar uma palestra para quinhentas pessoas no Centro Cultural ali perto sobre Física Quântica e Espiritualidade. O ingresso era uma lata de leite em pó para crianças portadoras de câncer.

Esta era uma atividade paralela que Mirabella exercia por puro prazer.

Quando ela disse isto, o tal do Rubão começou a chorar e disse que também era uma pessoa caridosa e que ajudava muita gente, para espanto do advogado que lhe acompanhava.

E, desconfiada, Mirabella continuou:

-Algumas pessoas me ajudaram a carregar as latas para o carro e depois voltei para cumprimentar os presentes.

-Ao retornar para o carro fui abordada pelos 5 rapazes. 

Descreveu a cena como acima, no início desta história.

-Alguém viu o assalto?

-Ela disse : Eu achava que não. Porém ao subir a ladeira, vi um senhor, que era segurança de uma escola ali localizada. E, ele me confirmou que viu tudo, quando pedi para usar o telefone.

Neste momento, tanto o delegado, como o escrivão e também o Rubão se inquietaram.

-A senhorita sabe o nome dele?

-Não! Ela disse. Mas posso ir lá tentar localizá-lo.

-Também posso provar que dei a palestra porque a organização tem a lista dos participantes com nome, email e telefones.

A esta altura chegou o advogado do tal Rubão.

E ele perguntou à queima-roupa : – A  senhorita tem a apólice do seguro do carro?

-A companhia já foi acionada? Já lhe enviaram o novo automóvel?

Mirabella sorriu e disse -Não, senhor! O seguro estava vencido.

Neste momento, o advogado de Rubão, enrubesceu. Chamou ele de lado e disse que iria abandonar o caso.

O escrivão, se referiu ao Rubão – Rubinho, você tem que se conformar.

Mirabella achou enigmática aquela intimidade do escrivão com o Rubão que passou a ser tratado como Rubinho. Ela perguntou -Vocês são amigos?

Os dois ficaram sem graça.

Mirabella e seus amigos ficaram na delegacia até às 5 horas da manhã.

E foi um custo para liberarem a pobre coitada.

O processo durou três meses.

Ela foi atrás do segurança, que prontamente, compareceu à delegacia  e deu seu depoimento, verdadeiro e simples como ele.

O teste grafotécnico deu negativo, confirmando que sua assinatura não era compatível com a do tal recibo de compra e venda.

A Organização do Instituto Cultural fez uma carta de protesto com a assinatura de todos os presentes na palestra de Mirabella.

Mirabella recuperou seu carrinho, absolutamente intacto, para surpresa geral, total e irrestrita de todos e todas.

Mirabella e seus amigos foram comemorar com um jantar regado a vinho.

E o advogado, ainda, absolutamente impactado com aquela história estapafúrdia. Repetia incessantemente  – O tal Rubão (ou Rufião?) chorou copiosamente na minha frente. Que coisa inacreditável!

Mas, Mirabella se sentia incomodada.

Embora confiasse em sua intuição. Pois sabia todo o tempo que algo estava errado. Que algo estava fora de lugar. Que o araque pode ser perigoso embora a sensatez da inocência supere tudo.

Um vazio inexplicável. Revisava a história e pensava que viver é um encargo de muito desempenho.

Que o devaneio pode se manifestar e se esgotar quando a sua verdade parece comprometida.

Que a charlatanice está o tempo todo presente e que algumas consciências são tomadas por vertigens. De precipitar o pior de si mesmo e ser hostil pelo puro prazer de enganar a si mesmo e aos outros.

E, que, embora reconheçamos este risco. Não temos o privilégio de preveni-lo. Dentre a inumerável multidão dos semelhantes que nos cercam, podemos sofrer condenações imerecidas provindas de insensatos.

Que embora se considerasse transparente e cristalina, percebeu o malogro gratuito que por alguns meses anoiteceu seu mito pessoal.

Que nos lugares que atravessou com esta questão, em desespero de causa, a  palavra percorreu um sentido interno com a necessidade de legitimar o que é monstruoso. E que era urgente e necessário, retomar os caminhos de sonhar.

Voltou à sua vida, ainda um tanto acorrentada a este intempestivo acontecimento.

Como se faltasse um laço para finalizar o clarão efêmero daquele instante angustiante.

Quatro meses depois, ao ler o jornal, no café de uma livraria, Mirabella viu a seguinte notícia: “Quadrilha de roubo de carros foi desbaratada na zona leste de São Paulo.” Policiais, assaltantes e agências de carros usados estavam envolvidos.  Rubens da Silva, conhecido como Rubão, era o cabeça da operação.

Mirabella finalmente suspirou aliviada. 

Não havia ali qualquer sentimentalismo.

Não era apenas a defesa de uma suspeição que proclamava sua inocência.

A sociedade que lhe traiu retomou a sua lei natural e o ideal civil.

A justiça foi feita. Ainda que momentaneamente, a prerrogativa social reafirmou os direitos inalienáveis dos homens.

ALINHAVOS DE LIBERDADE Shellah Avellar

A Arpillera é uma técnica têxtil chilena que possui raízes numa antiga tradição popular iniciada por um grupo de bordadeiras de Isla Negra, localizada no litoral central chileno.As arpilleras originais eram montadas em suporte de aniagem, pano rústico proveniente de sacos de farinha ou batatas, geralmente fabricados em cânhamo ou linho grosso.

Normalmente junta-se retalhos de tecidos e fios para reproduzir cenas do cotidiano ou memórias de ontem , hoje e sempre, que são costuradas à juta em pontos livres.

Não é preciso dominar  técnicas de bordado ou costura. Basta viajar com a  agulha e as linhas com suavidade e criatividade.

 A cantora e folclorista Violeta Parra aprendeu esta arte e a mostrou para o mundo, e exibiu suas obras no Museu do Louvre, em Paris. Violeta dizia que a arpillera é “uma canção bordada”.

E, assim, por meio das arpilleras, as mulheres chilenas do campo e da cidade conseguiram registrar histórias e fazer denúncias dos terríveis tempos da ditadura de Augusto Pinochet nos anos 70.

Dia 11 de maio, estive na IV Feira Nacional da Reforma Agrária no Parque da Água Branca e participei da Oficina Arpilleras com o Coletivo Arpilleras da RSM -Rede de Saúde Mental do MST, que acontece desde 2020, para acolhimento dos(das) militantes do Movimento.

Além de ser acolhida com alegria e carinho pelas moças profissionais e meticulosas, pude experimentar ainda que por um tempo exíguo, a técnica e compreender a intenção das meninas da Arte de Bordar como Resistência.

Um estilo de arte que situa o acontecimento como esperança de vida e sua mobilidade em relação à ética da ação de resistir, herança de luta em dias sangrentos, em que a obra de arte se  transforma em seu próprio mito, de não adequação a um contexto histórico de privação de liberdades.

A IV Feira Nacional da Reforma Agrária, além de oferecer a  abundância de um “possível“ país sem fome, num congraçamento de mãos  produtivas e rostos esculpidos na força da terra,  artistas e artesãos, deixa um lastro de alinhavos livres e bordados que se traduzem no estoicismo da brava gente brasileira.

Que orgulho!

photos: Shellah Avellar

#oAmorSIM

photos :Iara Milreu Lavratti

Coletivo de Comunicação da Rede(RCVD)

Iara Milreu Lavratti / Marilia Fonseca / Gab Monteiro / Giulia Mafort

Coletivo De Saúde Mental da Rede (RCVD)

Paula Sasaki / Carolina Schon

arquivo MST

TESTEMUNHO E LITERATURA Shellah Avellar

Dia 25 de março de 2023 , de 16H às 18H ,na Casa Das Rosas, aconteceu um Encontro de Mulheres Feministas : Deborah Fasanelli ( Professora, psicopedagoga, gestora do município SP, ativista animalista, militante sindical pela Educação ) e Marcella Millano (psicóloga, militante LGBt e anti-manicomial, diretora do SINPSi SP), para discutir os modos de expressão literária sobre a questão histórica do eclipsamento feminino na cultura e no cotidiano, com mediação da jornalista Shellah Avellar, a partir das crônicas e matérias do livro de sua autoria  Mulher na Palma da Mão. Após o debate, teve o show Serenata das Insones, com o grupo Teatro Geográfico (Ayiosha, Barbara,Carol,Carolina,Caroline e Mariana) com direção de Tatiana Vinhais.

Mídia:

Bússola Cultural: semana destaca futebol, música e cinema | Exame

Casa das Rosas no Instagram: “Receberemos um bate-papo especial! ❤️ Testemunho e Literatura é um encontro de coletivos feministas para discutir os modos de expressão literária sobre a questão histórica do apagamento do feminino na cultura e no cotidiano, com mediação da jornalista Shellah Avellar, autora do livro Mulher na palma da mão. Durante o evento, será apresentado o show “Serenata das Insones”, com o grupo “As mulheres que não dormem”, com direção de Tatiana Vinhais. Anote na agenda ✨ 📆 Dia 25/3, às 16h 🌹 Jardim da Casa das Rosas #culturasp #casadasrosas”

Show com artistas latinas e Sarau de mulheres na Rede de Museus-Casas Literários de SP (abcdoabc.com.br)

https://www.casadasrosas.org.br/agenda/testemunho-e-literatura

HISTÓRIAS FANTÁSTICAS (miriammorganuns.blogspot.com)

Mês das mulheres nos museus-casas com show de artistas latinas e sarau. Confira a programação! – dica de teatro

AUÊ.BANDA.NÓS. Shellah Avellar

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A lenda de Ariadne, filha de Minos, rei de Creta, conta que ela ajuda Teseu, a sair do labirinto do Minotauro, seguindo um novelo de lã, o “fio de Ariadne”.

Fio de Ariadne, nos permite seguir os vestígios das pistas no inesperado, ordenando a pesquisa, até que se atinja um resultado. O elemento chave para aplicar a linha de Ariadne a um problema é a criação e manutenção de um processo que permita regressar, ou seja, fazer um backtracking.

Backtracking é um algoritmo que representa um refinamento de busca em profundidade.

Agora, por mim denominado AUÊ DE CARNAVAL.

Que não me ouça, o matemático Derrick Henry Lehmer.

Como por aqui, a ordem é subverter, começamos assim:

O jornalista Sergio Gomes, articulador da porra toda, ao sugerir a pauta sobre este acontecimento histórico, e aparentemente “inocente”, me deu o fio e me jogou no labirinto de lembranças, informações e histórias de pessoas lindas. Uma emanação da vontade de estarmos juntos amenizando as dores que nos foram infligidas por celebrarmos liberdades.

Agora não me resta nenhuma solução a não ser “escrever sem moderação”.

Do NAÏF ao HIPER-REALISMO

Em 1 de setembro de 1977, o escritor e jornalista Lourenço Diaferia, publicou a crônica HERÓI. MORTO. NÓS. na Folha de São Paulo.

Folha Online – Folha 80 anos – Tempos Cruciais (uol.com.br)

Diaféria, até então, era considerado pacato, porque imprimia em seu texto universos inquietantes em furiosas brechas de sol, com sua linguagem simples e humor cativante. Um expressivo representante da literatura pós-moderna brasileira. Chegou a ser taxado de Naïf, por Boris Casoy, seu editor na época, que lhe atribuiu o apelido por seu estilo ingênuo.

Acontece que todo Naïf tem um dia de Hiper-realismo.

Ao tomar conhecimento de que o sargento, Silvio Delmar Holenbach, Militar do Serviço de Intendência do Exército, morreu, após salvar um garoto que havia caído em um poço de ariranhas no Jardim Zoológico de Brasília, desencadeou-se nele, um sentido de urgência. Destes, que faz borbulhar nos nervos, a poética da revolta. Onde, se tenta digerir os restos de valores mortos.

Não dava para desviar os olhos. E, o cronista, observador privilegiado da cena, com sua pena, à guisa de microscópio, apontou a virulência.

No olho do furacão dos anos de chumbo, vomitou sua indignação:

“E, todavia, eu digo, com todas as letras: prefiro esse sargento herói ao Duque de Caxias. O Duque de Caxias é um homem a cavalo reduzido a uma estátua. O povo está cansado de espadas e de cavalos. O povo urina nos heróis de pedestal”.

Foi o estopim, para ativar a verve sanguinária da repressão e seus asseclas. Não vou citar os nomes, porque aqui só damos créditos aos heróis.

Foi preso em 15 de setembro e solto cinco dias depois. Mas, só conseguiu provar sua inocência em 1980.

Em desagravo, a folha de SP, publicou a coluna dele em branco e os amigos da agência Folha, Jorge Araújo, Sergio Gomes e José Vidal Pola Galé criaram um bloco/passeata NÓIS SOFRE MAS NÓIS GOZA, que desfilava em “ELE”( letra L de Lourenço e  de  Liberdade),no centro da cidade – do monumento ao Duque de Caxias, na praça Princesa Isabel, seguia pela Avenida Rio Branco e Avenida Ipiranga, até chegar ao Bar Redondo.

Havia uma certa apreensão no ar, por conta do assassinato do jornalista   Vladimir Herzog em 1975, o que repercutiu na Comunidade de Jornalistas e na família de Lourenço.

Entrevistamos Geiza Diaféria, esposa de Lourenço, 46 anos depois.

Qual foi o impacto emocional no Lourenço Diaferia, pós-prisão pela repressão em 1977?

Lourenço era uma pessoa com valores muito sólidos. A prisão foi um percalço, o que não o impediu de continuar a expressar sua visão da cidade e do país, mostrando as injustiças, as feridas do povo trabalhador e da cidade, talvez se utilizando mais do recurso do humor em algumas crônicas para que elas fossem mais “palatáveis” a determinados leitores.

Como repercutiu em você? E na família?

Senti uma profunda decepção por ver tamanha ignorância, com uma prisão totalmente sem fundamento, tendo que cuidar de 5 filhos na época, sendo 3 adolescentes e 2 crianças. Os filhos mais velhos já entendiam o que estava acontecendo e ficaram indignados. Os mais novos, embora não entendessem a situação, sentiam a ausência do pai, que era bem presente.

Mudou o comportamento dele como pessoa e como cidadão?

Lourenço continuou a mesma pessoa. A única coisa que ele falou foi “eles não entenderam o que escrevi… Pena!”

Como você definiria numa frase, este acontecimento?

Um momento triste da história em que a ignorância e a violência, sob a égide de ordem e progresso, um cidadão comum foi injustiçado, porque expressou um sentimento comum a muitos que não tinham voz.

Três palavras que traduzam o fato pra você como mulher dele:

Ignorância, insensibilidade e violência.

Ele relembrava a situação? Ou arquivou?

Não gostava muito de relembrar, mas, frente à repercussão do ocorrido, vez ou outra se via obrigado a responder e esclarecer situações relacionadas ao período.

Como se sente ao saber da festa, Auê de Carnaval, 20 de fevereiro, que remete ao acontecido em setembro de 1977?

É muito importante relembrar o que aconteceu no passado para que não se repita mais. E o Carnaval, como identidade do nosso povo, é a melhor forma de confrontar a ignorância.  Acabamos de ter uma pequena amostra de que ainda há muita ignorância nos rondando.

A origem da palavra AUÊ, por si só já é controversa:

Alvoroço. Confusão.Tumulto.

E, em língua africana ioruba, significa “Meu Amigo”.

Ora! Ora! Nada mais pertinente do que um Alvoroço de Amigos.

E, assim, na Praça Vladimir Herzog, durante um dos encontros em homenagem póstuma a Elifas Andreato, que dá nome ao Espaço Cultural a Céu Aberto, o jornalista e artista plástico Enio Squeff, sugeriu a realização de um AUÊ de CARNAVAL, resgatando o bloco NÓS SOFRE, MAS, NÓS GOZA em sua mais completa tradução.

Em seguida, o jornalista, publicitário e escritor Liber Matteucci, “de lá do lado, do lado, do outro lado, do lado, lado de lá ”, em terras de nossos “colonizadores” (ou invasores?),  sugeriu a contratação da Banda Operária da Lapa.

Foi marcada a data:20 de fevereiro, segunda, às 17H.

E, daí, do tempo espasmódico das rebeliões, emerge um estado latente de “comunhão”, travestido num clamor pela alegria. Sugestões, talvez, sussurradas aos seus ouvidos, pelos Magos da Subversão, que deixaram entreabertas, as portas de resistência inabalável.

E, então, como um epitáfio às avessas, honramos nossos companheiros de copo e de cruz, para sempre “presentes”.

E está institucionalizado o AUÊ DE CARNAVAL.

A Corporação Musical Operária da Lapa é uma comunidade musical amadora nascida no final do século XIX. Mistura-se à história de São Paulo, composta pela  classe operária: mecânicos, metalúrgicos, eletricistas, frentistas, bancários, militares e professores, que, ajudaram a tecer sua trajetória impregnada de simbolismos. Enriquecida com a imigração, principalmente italiana, e com a  construção das linhas e oficinas da São Paulo Railway Company.

É qualificada por seus músicos como sendo “a banda mais antiga de São Paulo”. O grupo possui sede própria tombada pela prefeitura de São Paulo, em terreno doado por Nicola Festa.

O que torna uma comunidade musical legítima, é sua capacidade em servir uma determinada localidade. Portanto, a Corporação Musical Operária da Lapa, se estabeleceu gradativamente em um espaço que oferece possibilidades de comunicação e sociabilidade entre seus integrantes e o público.

Segundo o jornalista William Finnegan, “o sentimento de pertencimento a um mundo distinto e integrado, herdeiro de uma tradição orgulhosa e independente, foi reforçado ainda mais pela continuação da longa tradição de bandas de música que desempenham uma função pública para a comunidade local”.

A primeira fase do grupo, um período dúbio, justamente pela carência de informações e a falta de registros, compreende sua fundação e se estende até a fixação do nome “Corporação Musical Operária da Lapa” em 1914.

Este período foi, para o grupo, uma fase marcada pelas intrincadas tentativas de se estabelecer como banda operária remunerada.

Seus primeiros nomes (Lyra da Lapa, Banda XV de Novembro e Banda dos Empregados da SPR), a grande influência italiana através de seus integrantes e singularmente o fato de estar entre as dezenas de bandas e grupos operários de São Paulo expressa que o conjunto foi um produto de seu tempo.

De acordo com a documentação recente da banda, depoimentos, algumas matérias de jornais, os livros de Hardman (2002, p. 371)17, Moraes (1995, p. 157)18 e Santos (1980, p. 81)19 e também de páginas da web, o aparecimento da CMOL é atribuído ao pianista e professor italiano Luigi Chiaffarelli (1856-1923).   *Dados extraídos da tese de Juliana Soares da Costa UNICAMP

No entanto, essa informação é indefinida.

Franco Cenni, casado com a neta de Luigi, relata que Chiaffarelli e  família vieram para o Brasil em 1880 a convite de um grupo de fazendeiros de Rio Claro, a fim de ministrar aulas de piano às filhas de fazendeiros do café. Contudo, Chiaffarelli permaneceu em Rio Claro por pouco tempo e regressou à capital em 1888.

Para esta questão, é necessário nos remetermos ao antropólogo Paul Connerton e sua noção de memória social:

Como as sociedades recordam?

Como é que a memória dos grupos é transmitida e conservada?

“As lembranças grupais se apoiam umas nas outras formando um sistema que subsiste enquanto puder sobreviver a memória grupal”, ressalta a psicóloga Ecléa Bosi.

Ao longo da observação participativa e do manuseio de documentos e reportagens, vimos a banda se reconhecendo como fundada em 1881. Como mencionado, é uma informação perpetuada pelo conjunto por toda sua existência, e ao redor disso criou-se uma narrativa – ou uma “mitologia” – tornando-se uma marca de orgulho para a banda, ter sido fundada por Luigi Chiaffarelli em 1881.

Neste caso, podemos sugerir que alguma performance de banda no bairro da Lapa, em 1881, formada por operários músicos com algum contato próximo a Chiaffarelli, mais tarde faria parte da Corporação, marcando assim a fundação do grupo.

Nossas experiências do presente dependem em grande medida do conhecimento que temos do passado e as nossas imagens desse passado servem normalmente para legitimar a ordem social presente. E, assim, são transmitidos e conservados.

Portanto, a memória social não necessita comprovação: ela é aquilo que as pessoas lembram e que continua a ter relevância no presente, perpetuando-se.

A memória é um espaço onde as esferas biológicas e socioculturais do ser humano se encontram e, ao serem integradas à vida em sociedade, adquirem significados.

A figura de Chiaffarelli e a data de 1881 indicam para os integrantes a importância da banda e trazem um capital simbólico para o grupo, além do sentimento de compromisso com a continuidade da banda.

Luigi Chiaffarelli

Talentoso Pianista, Maestro e Professor, admirado pelos seus alunos, criou em São Paulo uma escola de interpretação musical que persiste até hoje através de seus discípulos.

Passaram por suas mãos, Guiomar Novais, Antonieta Rudge, Maria Edul, Francisco Mignone e Guilhermina de Freitas, entre outros.

Sua filha, Elisa Hedwig Carolina Mankel Chiaffarelli (Liddy Chiaffarelli) casou-se com Paolo Agostino Cantu, com quem teve dois filhos, Elza e Bida.

Liddy, casada pela segunda vez com o Maestro Francisco Mignone, pertencia à sociedade paulistana e tinha sólida formação musical e revolucionou a prática de iniciação musical. Aliou-se a Mario de Andrade na semana de 22, e com seu marido, fazia apresentações em favelas no Rio, com recepção bastante entusiástica. Uma Escola Pública em Paty do Alferes, RJ, leva seu nome.

Seu bisneto, Roberto Cenni (filho de Elza Cantu Cenni e Francisco Cenni), desconhecia a existência da Banda Operária da Lapa. Mas, me enviou uma carta em homenagem ao bisavô, oriunda da Comunidade de Cercemaggiore, cidade natal de Luigi, datada de 06.08.2022, onde apontam o pai de Luigi, Olympio, como maestro de bandas e orquestras, em sua região, o que comprova seu DNA.

Ele declara sobre o bisavô:

Luigi Chiaffarelli veio ao Brasil patrocinado por famílias ricas de Rio Claro e desenvolveu uma importante escola pianística bastante conhecida. Porém este outro lado de promover bandas de operários é bem pouco divulgado. Creio que proporcionar o encontro de “pessoas simples” com a música num país essencialmente capitalista é uma bela atitude e orgulho-me de Luigi ter tido esta iniciativa.

Franco Cenni, Elza Cantu Cenni(neta), Liddy Chiaffarelli (filha), Anna Maria ,Mario Cenni
e Roberto Cenni(bisnetos de Luigi Chiaffarelli) 1958

Acervo Folha SP registro de falecimento do Maestro Luigi Chiaffarelli há 100 ANOS

A formação atual da Banda Operária da Lapa


A Corporação Musical Operária da Lapa ainda se mantém ativa contando com diretoria, regente e estatuto próprios. Foi registrada formalmente como uma associação privada em 1972, e desde então é mantida graças ao caráter voluntário do trabalho de seus membros.
A banda era restrita apenas aos músicos homens, mas, no final dos anos 70, começaram a aceitar mulheres.

Ieda Viera de Figueiredo, trompetista.

É o único elemento feminino da Banda, neste momento.

Professora e agente de saúde. Já tocou na Banda de Osasco. Fez parte do coral da Cultura Inglesa. Já integrou a Banda Operária da Lapa, há alguns anos atrás. Mas, retornou há um ano. Apesar de ser a única musicista mulher da Banda, deixa claro que foi muito bem recebida. Segundo ela, são pessoas maravilhosas. E garante que se sente feliz com a mesma intensidade de quando tinha 20 anos.

Jose Maria Tamburu, sax tenor

Entrou na banda aos 18 anos, e a preside há 15 anos. Diz que todos os momentos têm sido memoráveis, mas, sente a ausência de seu pai, o trompetista João Tambor, que lá tocou por 30 anos. Se ressente da falta de apoio do poder público, para a manutenção das instalações, dos instrumentos, infraestrutura básica e apoio a novos projetos.

Maestro Nestor Avelino Pinheiro

Segundo o maestro a Juventude não tem interesse no estilo de música que as bandas tocam.

“Talvez se houvesse um projeto de Escolinha de Bandas, poderíamos tentar despertar o entusiasmo na molecada.”, sugere Nestor Avelino.

Trompetista, acabou virando maestro, a convite do pessoal da Banda. Nascido em Nazaré Paulista, seguia a banda e gravava as músicas durante as apresentações nas festas locais. Aos 50 anos de idade começou a aprender música.

Acabou entrando na Banda Operária da Lapa e está lá até hoje.

Para ele, a banda por si só já é um acontecimento.
“É minha vida “, finaliza emocionado.

BANDA OPERÁRIA DA LAPA

Aqui jaz a aproximação elíptica de seres ímpares que se amarram em nós, para se definirem como NÓS e libertar os pássaros da Alegria e da Camaradagem em NóS.

Vlado Diaféria Elifas

JORGE ARAÚJO

Fotojornalista autodidata, começa a fotografar em meados dos anos 60, trabalhando desde 1973 para o jornal Folha de S.P. É um dos grandes nomes do FotoJornalismo do Brasil, tendo documentado quatro Copas do Mundo (1978, 1982, 1986 e 1998), diversos outros eventos esportivos, como corridas de fórmula Indy e a Copa das Américas, bem como viagens e campanhas presidenciais e outros importantes eventos políticos.

Compositor do samba Nós Sofre mas Nós Goza, Jorge Araújo é um sorriso largo que inunda o mundo com suas lentes precisas para tirar dos fatos seu melhor momento. Mistura insolências e travessuras legitimamente conquistadas com afeto.

https://clipchamp.com/watch/f3f7I06c7M8

NÓIS SOFRE MAS NÓIS GOZA

A gente canta o sofrimento

Em verso ou prosa

Nós sofre, mas nós goza

Nós sofre, mas nós goza

Ai, que delícia

Tenho andado neste bloco-passeata

Pra lembrar Lourenço Diaféria

Nesta praça

E o que me resta

É o grito bem gritado

Meio troncho de saudade

É tudo o que me resta

Me espanca com o pandeiro

Me agride com a cuíca

A gente canta o sofrimento

Em verso e prosa

Nós sofre, mas, nós goza

Ah que delícia!

JOSÉ VIDAL POLA GALÉ

Mais conhecido como Pola Galé. Nasceu em Marília, no interior de São Paulo, no dia 6 de dezembro de 1952. Filho de espanhóis, tem memória de muitas histórias da Espanha, inclusive da Guerra Civil Espanhola, já que seu pai participou. Morou durante um semestre em Tauste, região em que seus pais nasceram. Mudou-se para Ribeirão Preto e foi lá que ele estudou e cresceu, foi pra São Paulo para fazer faculdade de jornalismo na USP e começou a trabalhar por lá. Trabalhou na redação da Gazeta Esportiva, na Folha de São Paulo, Editora Abril, TV Globo, Record e TV Cultura.de jornalismo da TV Cultura. Com mais de 30 anos de profissão e se tornou um dos nomes mais respeitados no telejornalismo brasileiro.

ÊNIO SQUEFF

Jornalista e artista plástico, teve a ideia de fazer acontecer na praça este Auê de Carnaval em homenagem ao Lourenço Diaféria.

Extremamente versátil, Squeff é um dos grandes nomes da Arte Brasileira, trabalhando com a renovação da tradição pictórica e abordando uma gama variada de temáticas, sobretudo aquelas consideradas relevantes para a cultura brasileira e, em especial, a paulistana. É reconhecido internacionalmente por suas ilustrações de obras literárias.

Em seu portfólio encontramos ilustrações, aquarelas, pinturas, xilogravuras, vitrais, painéis, entre outras linguagens.

Desafiou-se, confeccionando em exíguo tempo, 15 estandartes (1,45 x 2,00) m2 de pintura e impressão silk-screen sobre chita, sendo 12 móveis e 3 fixos.

O tecido chita, foi escolhido propositadamente por Scheff, não somente por seu baixo custo e fácil manuseio, mas, por ser um verdadeiro ícone da cultura popular brasileira.

LIBER MATTEUCCI

Jornalista, lecionou Redação na PUC-RJ. Publicitário no eixo Rio/SP e em Lisboa. Diretor de Criação da Agência da Casa da Rede Globo-RJ e Tele Monte Carlo em Roma. Escreveu textos de humor para revistas, roteiros de HQ e colaborou no Pasquim. Em 2011 publicou o romance “Sangue Bom” (finalista do Prêmio Sesc de Literatura 2008), “O Espírito da Coisa” e mais três livros. Hoje, dedica-se inteiramente à carreira de escritor.

Apesar desta biografia recheada de feitos estrondosos, Liber é um homem simples, sensível, talentosíssimo e solidário, e aí reside sua força hercúlea em se reinventar. Uma obra de arte que tende a maravilhar as pessoas ainda que à distância.

Típico de uma pessoa que se provoca e busca outros caminhos, começou a aprender clarinete aos 50 anos. Tocou na Banda Amigos do Castelo Novo, em Portugal, de 2001 até 2011. E, ao voltar para o Brasil, se ofereceu para tocar na Banda Operária da Lapa e foi amplamente aceito. Por lá ficou por 3 anos.

Ele sugeriu a contratação da Banda para o AUÊ, e, para isto, ressuscitou em si o menino ávido por aprender e revelou o homem grato. Que beleza de pessoa.

Painel de azulejos presenteado pela sua mãe quando integrava a Banda Castelo Novo, Portugal.
Liber Matteucci é o quarto da esquerda para a direita.

OSWALDO LUIZ COLIBRI VITTA

Está na estrada do jornalismo há 45 anos. Já trabalhou nos principais jornais brasileiros: Diários, Folha de São Paulo, Estado e O Globo .E emissoras de TV: SBT, Record, Bandeirantes e Globo. Começou no rádio como produtor do Studio Free, em 1976. Foi repórter e chefe de reportagem na Rádio Globo e Record. Há quinze anos trabalha em projetos de comunicação dos trabalhadores. Foi apresentador do Jornal Brasil Atual . Em 2017, ganhou o prêmio APCA com o programa musical “A Hora do Rango”. Hoje dirige a Rádio Brasil Atual, 98,9 FM. 

Apesar do lastro curricular e promover revoluções artísticas por aí afora, Oswaldo se expressa através da alegria. Tudo nele é movimento. É ritmo.

Não por acaso seu apelido é Colibri, que ele assina como sua identidade maior.

Me falou com orgulho da fábula do Colibri, que descreve um grande incêndio na floresta e os animais fogem. Mas, o colibri, voava até o lago mais próximo e regressava com uma gota no bico. E, aos críticos, ele dizia estar feliz de fazer sua parte.

Colibri, faz, com profissionalismo e solidariedade, a curadoria dos artistas e músicos da Praça Vladimir Herzog  e do Centro Cultural a Céu Aberto, desde que Elifas Andreato nos deixou. Arregimenta talentos que se apresentam gratuitamente, porque apostam em sua seriedade e em seu compromisso com a qualidade.

E, arrisco aqui, que me perdoem os ateus, a exaltar a sua ternura, com outra lenda guarani: acreditam que o Mainimbú(Colibri) tem um dom especial de coletar o melhor dos que se foram e levá-los para o céu, em seus delicados bicos. Creio que Elifas Andreato e Vladimir Herzog estão gratos por isto.

Alguns eventos já realizados no Centro Cultural a Céu Aberto Elifas Andreato, que tem acontecido na Praça Vladimir Herzog. Confiram!

SAMIR SALMAN

Médico, administrador e idealizador do Hospital Premier – Grupo MAIS, que é o primeiro hospital privado do Brasil norteado pelos cuidados paliativos.
Gestor da São Paulo Internações Domiciliares, reconhecida hoje, como uma   das mais respeitáveis empresas do segmento de Home Care.

Dentro do Grupo MAIS, Modelo de Atenção Integral à Saúde participou na gestão de planos de saúde, equacionando recursos e controlando carteiras com ferramentas de monitoramento e medicina preventiva.
Ativista ferrenho  de  frentes que defendem políticas públicas ligadas ao envelhecimento e aos cuidados paliativos.

Todo AUÊ precisa de um porto seguro, para que os amigos possam ser cuidados condignamente, quando atingem a margem fronteiriça da vida.

Samir, “companheiro falante”,(em árabe), curiosamente “silencia”, mas, observa e se movimenta, para que os detalhes pragmáticos sejam providenciados e o AUÊ aconteça. Assim como o jurista e médico AVERROES, autor de A Destruição da Destruição (ou A Incoerência da Incoerência), Samir enxerga o paradoxo inerente às cabeças brilhantes dos anciãos e seus corações-meninos.

SERGIO GOMES

Jornalista .Em 1978, fundou a OBORÉ EDITORIAL. Desde 1994, é seu diretor titular. Lecionou na USP: Jornalismo Sindical, Comunitário e Popular de 1986 a 1992.E atuou na imprensa sindical. Atualmente, integra o Conselho Deliberativo do Instituto Vladimir Herzog e coordena o Projeto Repórter do Futuro. Acumula prêmios nacionais e internacionais como jornalista e defensor de Diretos Humanos. OBORÉ Projetos Especiais (obore.com)

Serjão, é muito mais que um tratado curricular. É um moto-contínuo. É a causa e o efeito. É o indivíduo e sua potencialidade criativa em juntar pessoas e colocá-las frente à sua própria grandiosidade. É nessa busca por unificação que nos comove em sua constante reverência pela amizade.

Sua experiência de vida que lhe levou ao limite da resistência física, em que o corpo foi levado à última armadilha que enreda o homem no desespero. O despojamento. O nada esperar. Onde a última esperança estava morta.

E teve o privilégio de sobreviver para reportar e continuar como protagonista de uma ressurreição vitoriosa com o olhar no futuro.

Um apelo amoroso que se refugia em seu corpo-muralha, impostura de uma ficção verdadeira.

Uma filosofia de sustentação de proezas guerreiras e políticas, enfrentando os demônios e seus embelezamentos patéticos de pseudodemocracia, com uma lucidez mítica.

A sua profecia é a ação aqui e agora.

Sergio Gomes é uma espécie de declaração solene que não foi publicada condignamente.

Chego ao final do labirinto, onde lhe entrego o fio de Ariadne. Depois de me permitir navegar por tempestades de lembranças em um mar de memórias atadas por laços inextricáveis.

Só sinto gratidão pela confiança em minha aventura e pela oportunidade de poder me lançar neste AUÊ, onde a amargura pela ausência de seres tão queridos e especiais deu lugar a esta epopeia abstrata, que resgata heróis do balão de ensaio da vida onde há risco e dor, mas, também, permite uma ode aos homens-carvalho.

E, assim termino a minha jornada mítica do herói, invertendo a marchinha de Chico.

Desta vez, a banda fica parada a nos ver passar, nos despedindo da dor,   cantando coisas de amor.

Mais que folia, resistência | Notícias | OBORÉ Projetos Especiais (obore.com)

FEMME DANS LA PAUME DE LA MAIN Shellah Avellar

EST LE RÉSULTAT D’UN LONG EXERCICE D’OBSERVATION DES FEMMES AUTOUR DE MOI ET D’AUTRES QUI ONT ATTIRÉ MON ATTENTION TOUT AU LONG DE MA TRAJECTOIRE. CE N’EST PAS UN HOMMAGE, MAIS UNE RECONNAISSANCE DES ATTITUDES ET DES COMPORTEMENTS QUI SE REFLÈTENT ET SE RÉFRACTENT EN MOI, ET COMMENT CELA PEUT INCITER D’AUTRES FEMMES À REFLÉTER OU À RÉFUTER CES SIGNES,QUE RÉPONDENT ENCORE ET ENCORE À UNE NORME ET QUE PLUS QUE JAMAIS IL EST NÉCESSAIRE DE L’AFFRONTER. IL N’Y A PAS DE JUGEMENT, MAIS PLUTÔT LA CERTITUDE QUE LA CONJECTURE PEUT CONDUIRE À L’ACTION DE TRANSFORMER SANS TANT DE DOULEUR, PARDONNÉ ET ESSAYANT ENCORE UNE FOIS, AUTANT QUE NÉCESSAIRE, POUR DÉMÊLER CETTE ÉNIGME DE LA FÉMINITÉ ET LE CHOIX DU GENRE, SANS NÉCESSAIREMENT DÉVORER, DÉVORER OU ÊTRE DÉVORÉ…JUSTE ÊTRE LA MEILLEURE VERSION POSSIBLE D’ELLE-MÊME.

FÊTE VIRTUELLE DU LIVRE FRANCE
FEMME DANS LA PAUME DE LA MAIN

https://clipchamp.com/watch/hjJXHveWzFd

ANESTESIA Shellah Avellar

Fui convidada pelo  querido amigo Germano Gonçalvez, a participar, juntamente com o Poeta Laercio Silva, do  SARAU URBANISTA CONCRETO para MORADORES DA RUA, na zona norte de São Paulo, numa ação dos Agentes Sociais Matheus e Wagner.

Aceitei imediatamente, não só por respeito ao amigo, mas, principalmente pelo público com que iríamos interagir.

Num tempo em que o abominável espírito natalino se apossa do ser humano, levando-o a ser caridoso e solidário, ao menos por um dia.

Um paliativo para que se auto console e lhe dê ares de homem de bem e saciar sua consciência de que “fez sua parte”.

A inquietação já tomava conta de mim misturada com um sentimento inexplicável e uma cobrança interna para não sucumbir à comiseração.

Fui para lá com o coração aberto, como em tudo que me proponho a fazer, mas, atenta à violência silenciosa que alguns seres humanos se impõem para machucar a si mesmos.

Cada um carrega uma história de dor e mágoas. E, alguns de nós, simplesmente desistem.

Cada um com sua anestesia de “estimação”. E, uns se demoram mais neste estado de alienação da dor.  

Prefiro não citar as substâncias. Mas, sim, refletir sobre o ser fantástico e exuberante que habita a essência de cada um, e, que, de alguma forma, se emaranhou em emoções desencontradas e ali, se deixou ficar.

Num tempo em que a comida é prioritária, levamos um sentido de urgência da poesia e de sons para alimentar a cesta básica da alma.

Sentimo-nos irmanados com o carinho de todos, e, devagarinho, fomos nos aproximando, nos sentindo à vontade, e logo, estávamos rindo, cantando e nos abraçando.

Apesar de alguns olhos ostentar fogos pálidos, vi brilhos de afetos incomensuráveis.

Golpes de talento irromperam nos batuques precisos, nos bamboleios de algumas meninas e na declamação acalorada e contundente  de versos de Fernando Pessoa através de um deles.

Sei o nome de todos. Não vou citá-los. Para preservar o anonimato a que se submeteram.

Mas, levo comigo para sempre a esperança de que não contribuímos para deixar a energia adormecida. E, que o sol, estrangulado nos barracos improvisados que chamam de lar, invada cada coração que por lá deixei e promova a reedição de cada personalidade que ali habita, transmutando a todos em sua melhor versão.

Ressoa em mim cada batuque, os versos de Pessoa e o abraço da moça que sussurrou em meu ouvido: “Não se esqueça de mim!”

E, tento, no caminho de volta pra casa, retomar minhas próprias dores e tingi-las de iridescências sobre as massas de minhas sombras.

E a certeza de que somos todos iguais neste escândalo chamado “vida”.